De Onde Vêm os Bebês

Eu entrei, mais uma vez, no parque. Gosto daqui. Acho que pela familiaridade com o lugar, afinal, nasci aqui. Todos nascemos, se não aqui, imagino que em lugares semelhantes a esse. Ver todas aquelas árvores me deixa fascinada. Elas têm tanta vida, são tão majestosas, mas ainda não sei como elas são capazes de fazer bebês. Já tentei ficar assistindo para ver os bebês nascerem, mas acho que só nascem durante a noite, quando eu já caí no sono.
Lembro-me de já ter visto, uma ou duas vezes, alguns bebês que sobraram, junto à raiz das árvores. Saí em silêncio para não acordá-lo. Ainda havia tempo para os pais virem escolher ele e eu não queria estar lá para atrapalhá-los. De outro modo, aquele bebê se tornaria alguém como eu, morando na rua, sem pais. Não é de todo mau. Eu como duas a três vezes por semana, durmo em cima de um papelão e ganho uma roupa quando a minha não me serve mais. O que poderia ser melhor que isso? Algumas vezes até tomo banho na fonte do parque, com passarinhos fazendo-o junto comigo. Nunca vi crianças com pais tomando banho. Talvez nem o façam.
Mais ainda assim, tenho curiosidade para saber quais são as vantagens de ter pais, pois, caso não houvesse, todas as crianças viveriam na rua. Não sei por que nunca fui escolhida. Acho que eu não era um bebê bonitinho e gordinho como aqueles dos anúncios que tem na cidade. Hoje me vejo no reflexo da água ou das vitrines e a única diferença que encontro é minha pele, que parece mais branca e magra que das outras crianças, mas gosto da minha palidez que tenho certeza de que é única. Normalmente as crianças que brincam no parque são rosadas ou vermelhas. Não sei se suas mães têm orgulho disso. Nunca vi crianças sendo escolhidas pelos pais, mas também não vejo os bebês que nascem das árvores, então pode ser possível.
Enquanto observo as crianças brincando nos brinquedos do parque, escolho uma mãe para conversar. A maioria delas está vestida de branco. Não quero que elas me vistam assim também. Há algumas muito juntas, com roupas extravagantes e conversando alto. Suas risadas são assustadoras, provavelmente terei pesadelos. Mas há uma moça. Ela parece nova, é muito bonita e está sentada num banco, observando as crianças brincarem. Ela parece feliz, parece gostar de crianças, pois está rindo só de observá-las. Penso um pouco e decido: é com ela que vou conversar. Sentei-me ao seu lado.
- Gosta delas, das crianças? – perguntei.
- É claro. Quem não gosta de crianças? – respondeu-me ainda rindo
- Não sei, mas deve haver quem não goste.
- E porque você diz isso? – agora ela olha para mim.
- Porque muitas pessoas me olham feio na rua.
- Mas isso não é pelo fato de não gostarem de crianças. É pelo que você é.
- E o que eu sou?
- Uma criança de rua. – respondeu envergonhada.
- Isso eu sei, mas não tenho culpa se ninguém me escolheu quando bebê.
- Como assim? Do que você está falando?
- De quando eu nasci da árvore. Ninguém me escolheu. Fiquei aqui, sozinha. Você gostaria de me escolher?
A moça me explicou que nas não nascemos de árvores. Que um casal, juntos, tem um filho, de maneira que nós nascemos de nossas mães. Ela me explicou também que, por algum motivo, fui abandonada no parque por minha mãe e que, como eu, todas as outras crianças de rua também foram abandonadas. Disse que não poderia me adotar, pois era um processo muito burocrático e, já que eu nunca tinha passado por nenhum orfanato, o processo seria ainda mais lento. Percebi que foi um modo delicado dela dizer que não estava interessada em mim, Agradeci-a pela explicação e fui para longe das crianças. Sentei-me, observando as árvores, me perguntando se os bebês nasciam dos galhos ou da raiz. Será que nasciam como as frutas?

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